Pessoas e fracassos, são importantes?
A região do Vale do Silício nos Estados Unidos é reconhecida como um dos maiores ecossistemas de inovação contemporâneo e virou referencia mundial. Quando algo ou alguém é considerado um sucesso, não demora muito para que surjam formulas do tipo receitas de bolo (os 10 blábláblá de blábláblá), que sugerem a possibilidade de replicação. E como tudo tem um ciclo de vida, este momento costuma marcar o principio da deterioração dos ideais originais.
Há alguns anos atrás passei um tempo no Vale, estudei, visitei empresas de vários portes, trabalhei, conheci pessoas e neste dia a dia duas coisas me chamaram à atenção, a importância atribuída as pessoas e a relação com os fracassos.
Não se preocupe pois este artigo não é mais uma receita de bolo, mas com foco nos dois pontos do título, vou tentar resgatar um pouco dos ideais originais baseado na minha percepção à época.
O homem é um ser social! Com base nesta premissa podemos assumir que pessoas e suas relações, são a base de tudo a nossa volta. Empresas, organizações e governos são compostos por pessoas em essência.
Ter uma boa ideia não basta, alguém tem que executá-la, uma ideia é apenas um sonho se não for realizada. Isto por si só já era oposto ao que se observava e ainda se observa aqui no Brasil, que é o medo que alguns empreendedores tem de falar sobre sua ideia pelo receio de terem ela “roubada”.
Pessoas são a chave, isto é fato, mas o conceito foi simplificado ao extremo para se encaixar nas “formulas de sucesso” e isto gerou distorções e excessos de todos os tipos. Passou a ser “descolado” as empresas postarem nas redes sociais áreas de lazer extravagantes, piscinas de bolinhas, sinuca, salas de descompressão, etc … Foram criados prêmios e publicações (a maioria pagos pelas próprias empresas) para reforçar e enaltecer estas iniciativas e benefícios e em pouco tempo isto virou padrão, toda empresa startup ou não tinha que oferecer este tipo de beneficio como “valorização” das pessoas.
Independente do modelo ser presencial, híbrido ou remoto, passamos a maior parte do nosso tempo útil dedicado ao trabalho, portanto esta não é uma defesa de um ambiente ruim sem apoio ou estrutura para que se possa realizar o trabalho, mas um chamado à realidade ao que realmente importa.
E a realidade é que para materializar uma ideia é necessário que as pessoas tenham a capacidade e experiencia necessárias, inclusive a de identificar, agregar e contratar outras pessoas que tenham os mesmos valores fundamentais, e se necessário, reconhecer que erraram e também demitir caso as pessoas não estejam de fato alinhadas aos seus valores, porque o compromisso maior é desenvolver o trabalho que deve ser feito para o negócio ter sucesso. As pessoas são importantes elas são a essência do negocio, são elas que fazem o sonho se tornar realidade através de ações concretas e planejadas, mas o negocio não existe para “satisfazer” a elas, é uma relação comercial onde se troca dinheiro por serviços.
Como exercício vale a pena ler e estudar a cultura de empresas bem sucedidas, são informações públicas, é só pesquisar por “culture and values” destas empresas.
A relação com o fracasso também tem as pessoas como protagonistas, pessoas que falharam, antes de tudo em algum momento tiveram a iniciativa de realizar algo, por isto não deve ser motivo de rejeição mas encarado como parte do processo, é uma oportunidade de aprender a como se sair melhor na próxima vez que for executar algo.
“Failure is not a permanent condition.”
Mas novamente se observa a distorção do conceito, resultando numa ode ao fracasso, mesmo sem a maioria das pessoas ter lido “Tabacaria” de Fernando Pessoa, passou a ser “descolado” exaltar o fracasso, “quebrei uma vez” diz um, já outro querendo ser melhor diz que quebrou duas ou três, alguns casos transparecendo nada além de “fanfic”, por vezes associado a venda de alguma “formula mágica” e raramente durante a experiencia, pois não existe nenhum glamour em fracassar, a frustração e a decepção te jogam no chão e se levantar e seguir em frente exige coragem e esforço.
O ponto então não é o fracasso em si, mas sim a análise e compreensão do quanto a experiencia resultou em amadurecimento. Não que se tenha que fracassar para amadurecer, mas se bem aproveitada, é uma oportunidade para acelerar o desenvolvimento de algumas competências, é uma prova de fogo que pode deixar mais forte.
Estamos em uma sociedade em transformação, identificar as armadilhas de uma interpretação corrompida de conceitos, pode ser o gatilho para mudanças necessárias e realização do sucesso como profissionais e cidadãos.