Como formar profissionais experientes
Nos últimos anos vimos uma demanda crescente por profissionais na área de tecnologia e que literalmente explodiu durante a pandemia devido o movimento acelerado de digitalização de setores até então pouco digitalizados e o surgimento de muitas startups animadas pelo excesso de liquidez global.
Outro movimento diretamente relacionado a pandemia que adicionou demanda foi a popularização do trabalho Home Office, apesar de já existir antes, ganhou escala durante a pandemia o que abriu as portas do mundo para profissionais brasileiros em especial os mais qualificados e com maior experiencia.
E dentre todas as subdivisões da tecnologia a que mais demanda recursos humanos é o desenvolvimento de software da ideação à concepção, pelo fato de que tudo demanda um software, inclusive o hardware nas industrias precisa de um software para que seja capaz de realizar suas tarefas.
Induzido pela demanda, pagando 3x mais que outras atividades, real possibilidade de mobilidade social, como resultado de todo este cenário observamos uma explosão de iniciantes na área ao mesmo tempo que cresce a carência de profissionais experientes.
Neste ponto vem a questão como acelerar o amadurecimento? A minha experiencia diz que não tem mágica, mas tem algumas coisas que podem ser feitas para que esta evolução produza uma nova geração de bons e experientes profissionais até porque o valor agregado está ai, falo disto mais para frente.
Antes eu vou tocar num ponto que tenho observado recentemente que é o papel das redes sociais neste cenário. O ser humano é social, nada mais natural que surjam os agregados sociais temáticos como a #bolhaDev no Twitter. Certamente existem outras, mas falo do ambiente que mais transito que é o Twitter. Como em toda rede social, temos ouro e chumbo e pela própria natureza do ser humano (foge do escopo deste artigo mas quem tiver curiosidade sobre o tema recomendo Tomás de Aquino, Nietzsche, Dostoiévski), proliferam os vendedores de sonhos, profetas do apocalipse, falso altruísmo travestido de generosidade tudo sempre em busca do engajamento pelo engajamento, como se fosse um fim em si mesmo.
Observo que a maior parte dos tuítes tende a convergir para um mesmo padrão raso, é como um “reinforcement”, um padrão que gera muito engajamento acaba sendo reproduzido a exaustão e o resultado é que tudo fica muito igual, com variantes na forma o conteúdo é sempre o mesmo; qual a melhor tecnologia, linguagem x é melhor que y, como eu consegui isto ou aquilo, as N atitudes que todo … deveria ter, as N ferramentas indispensáveis para isto ou aquilo, como encontrar uma vaga na “gringa” ou qualquer outro hype do momento.
A pergunta que faço é, no que isto ajuda de fato a produzir uma nova geração de bons e experientes profissionais?
No meu ponto de vista não ajuda em nada, então fica apenas um alerta, cuidado com a “informação” que se consome, saiba distinguir informação de opinião, mas divirta-se pois tem o seu valor sabendo garimpar (também foge do escopo deste artigo como fazer isto, até porque é muito pessoal com base no que se busca).
Mas voltando ao ponto principal sobre possibilidades de como acelerar o processo de amadurecimento eu sugiro olhar aos processos clássicos de aprendizagem de habilidades, temos inúmeros exemplos ao longo da história da humanidade as rendeiras, tecelões, sapateiros, alfaiates, musicistas, artistas plásticos, médicos (até hoje existe a residência médica) o que existe em comum no processo? A relação mestre x aprendiz, sendo o mestre alguém que tem o domínio da habilidade mas principalmente experiencia.
Meu convite a reflexão é que as próprias empresas deveriam ter nas suas equipes profissionais experientes com técnica, habilidades e disposição para desempenhar este papel, poderia ser oferecido como um beneficio que tem um valor muito maior que um auxilio alimentação, auxilio moradia, sala de descompressão, sala de jogos e tantas modernices que todo dia surgem, etc …
A maturidade profissional, a senioridade, não é apenas conhecimento técnico e tem que ser acompanhada de maturidade emocional e esta só se desenvolve e aprimora passando por situações práticas que podem ser muito mais bem aproveitadas como oportunidades de aprendizado com o apoio próximo de um profissional experiente.
Alerta; Não confundir esta proposta com o que atualmente é chamado de “mentoria”, pois devido a decadência da essência, o termo vem sendo usado com conotação marqueteira que nada mais é que uma gourmetização de cursos técnicos de baixa qualidade que se mesclaram com formulas de “sucesso” só pra cobrar mais caro e enganar os menos experientes.
Para o profissional experiente, independente se na empresa que trabalha exista um programa formal de mentoria, ter um ou mais aprendizes, de acordo com a disponibilidade, também trás vantagens, pois comunicação e gestão também são habilidades e portanto precisam ser exercitadas, ou seja, uma relação em que todos ganham.
Outra vantagem é o fortalecimento da rede de contatos e relações, sempre se diz que network é muito mais sobre semear do que sobre caçar, mas na pratica o que se observa é que apenas quando se precisa é que se busca ou lembra de alguém. Relações duradouras que traspassam fronteiras corporativas são fundamentais para o sucesso e realização profissional.
Outro ponto para reflexão é que a demanda em alta, citada no inicio do artigo, permanecerá assim para sempre?
No meu ponto de vista não, vivemos ainda num momento de euforia, mas o auge já foi, temos “vento contra” à frente do lado macro econômico alta dos juros e reforma tributária (CBS, Cide digital) e do lado técnico, proporcionalmente a maior demanda é por software com baixo valor agregado (CRUD, codificação, testes, suporte) e menos de alto valor agregado (Pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias/processos, AI, ML), de novo a experiencia e a historia podem nos ajudar basta olhar o que aconteceu na Índia a partir de 2017 (fica ai uma curiosidade para pesquisa)
Alguns sinais já estão sendo dados, as startups que desempenharam um papel decisivo para o aumento da demanda por profissionais, já não tem mais tanto dinheiro fácil como tiveram até agora e terão que ser menos perdulárias no uso dos recursos disponíveis e muitas sucumbirão pois são economicamente inviáveis sem o dinheiro fácil e de baixo custo.
A realidade é que não haverá demanda para tantos “juniores” no médio-longo prazo e a hora de se preparar para este novo cenário é agora, qualquer que seja o nível que estiver, a régua vai subir e é melhor estar do lado de cima da mediana e se possível o mais longe possível dela.